VELHICE DÍGNA


por Selma Dib *
agosto 1995

Aquela cena, repentinamente, fez-me parar e pensar. Pensar na vida como nunca havia feito antes.
Uma realidade dura, cruel de sabor acre, sem artifícios, beleza ou poesia. Só realidade, fria, crua e indigesta.
Aquela velha senhora presa a cama dependendo de mim, de nós, para tudo. Desde as necessidades primárias instintivas, a dependência psicológica, o conforto espiritual e até o apoio financeiro.
A casa desfeita em velhos cacos, traças, poeira e cupim. O cheiro do mofo exalado entre um armário e outro. O lar... sombrio, escurecido pelos tristes acontecimentos. A enganosa economia - amealhada ano após ano, pechinchando migalhas, privando-se muitas vezes, de boa mesa, de boas roupas, passeios, de um mínimo conforto para a avançada idade que usufruía, evaporou-se em poucos dias.
Atônita, não consigo abafar a pergunta que me martela o cérebro e aflora à garganta: De quem é a culpa? Do plano de saúde? Eles tinham, INSS (SUS). Funciona? Sim; precariamente. Ilusão, credulidade de um inocente e velho cidadão. Existe um culpado? Teria sido a culpa do ancião que baseou sua vida regrada nas notícias dos jornais e da televisão?...que acreditou nos milagrosos planos, nos reis, tostões, cruzeiros, cruzados e reais... condições?... que acreditou na enganosa poupança que nunca acompanha a inflação?... na promessa de Ministros, na mirrada aposentadoria sua e de sua doente anciã?
Meus olhos passeiam atentos pelo ambiente e por mais que queira ser otimista, o pessimismo ocupa todo o espaço visualizado.
Diante daquele quadro, sentia-me apavorada, ameaçada. Desesperava-me. O medo que me domina seria por eles, por mim ou por vocês?
Via naquela cena o meu, o seu, o nosso destino.

FUTURO DE BRASILEIRO.

Onde está o Presidente? Qual o nome do nosso tão amado país?
Será por acaso...

                   BRASIL?!         

* Selma Dib é poetisa
 com livro publicado pela Editora Nova Civilização                           

Comentários

  1. Muito pertinente o artigo "Velhice Digna", nós ocidentais nao temos muito a cultura de ver a vida como um conjunto de fases, enquanto jovens, permitimos somente aquilo que nos satisfaz quando ainda produzimos algo. Quando chega a velhice o que deparamos com a chamada "previdencia", o que é isto? Nao previnimos nada para nosso futuro e nem ensinamos os mais jovens a respeitar este futuro. E o triste é sabermos que temos uma carga de sabedoria e experiências vivida e não respeitada. Os ocidentais tem a cultura de conservaçao das experiências e aprimoramento das mesmas.O qual a velhice é prêmio da vida. Uma família que abriga um idoso é privilegiada da sociedade e respeitado por um governo. E nós brasileiros abandonamos nossos idosos nos asilos e casas de repousos no momento em que eles mais precisam dos entes queridos e apoio governamental. So que esquecemos que um dia seremos eles. Será que queremos viver na frieza de um leito sem a maciez e o calor da necessária e devida proteçao familiar e governamental?

    Alcioneia

    ResponderExcluir
  2. Desculpe-me, os orientais que tem a cultura de conservaçao...



    Alcioneia

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

CAMINHA TRÊS LUAS COM MEUS SAPATOS

OS FILHOS SÃO COMO AS PIPAS

O QUE É SER PRAGMÁTICO?